O jovem rico. Meditação Filosófica sobre Mateus 19- 16,22. .
Prezado leitor,
A passagem bíblica de Mateus 19, 16-22, que descreve o encontro entre Jesus e o jovem rico, é mais do que uma narrativa religiosa. Ela é, também, um convite à reflexão filosófica sobre o que realmente significa levar uma "vida boa", sobre o conflito de valores e a natureza da liberdade humana. Ao examinarmos o texto sob uma lente filosófica, percebemos que a conversa entre Jesus e o jovem ecoa questões fundamentais que intrigaram pensadores por milênios.
A pergunta inicial do jovem, "Mestre, que farei de bom para possuir a vida eterna?", nos remete diretamente à eudaimonia, conceito central na filosofia aristotélica. Para Aristóteles, a eudaimonia (traduzida como "felicidade" ou "florescimento humano") não é um prazer momentâneo, mas um estado de bem-estar alcançado através de uma vida virtuosa. O jovem, embora rico, sente que algo lhe falta. Sua pergunta revela uma busca por uma conduta que o leve a essa plenitude, algo que ele intui que o mero acúmulo de bens não pode proporcionar. Jesus, ao listar os mandamentos, apresenta o que poderíamos chamar de uma ética de dever, as regras básicas para uma vida justa. No entanto, o jovem já cumpre essas regras. Ele busca algo mais, um caminho para a perfeição que transcenda a mera observância da lei.
O ponto de virada da narrativa ocorre quando Jesus propõe uma exigência radical: "Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens, dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me". Essa instrução expõe um profundo conflito de valores. O jovem valoriza sua riqueza não apenas por seu valor instrumental (o que ela pode comprar), mas por seu valor simbólico: ela representa sua segurança, sua identidade e seu status. Jesus, por outro lado, propõe um sistema de valor alternativo, onde a verdadeira riqueza é interna e intrínseca, encontrada no desapego e na capacidade de amar e servir ao próximo.
A tristeza do jovem ao se afastar não é apenas por perder o dinheiro, mas por confrontar a impossibilidade de conciliar esses dois sistemas de valores. Ele está preso a suas posses, e essa prisão o impede de atingir a verdadeira liberdade proposta por Jesus. O “tesouro no céu” pode ser interpretado, filosoficamente, como um tesouro de caráter e virtude que não pode ser corrompido ou perdido, uma recompensa que reside na transformação interior do indivíduo. A passagem, portanto, nos desafia a refletir sobre o que realmente nos aprisiona e sobre o que, de fato, nos liberta para uma vida de plenitude e significado.
Desejo que esse texto ajude.
Cordialmente,
Professor Gilberto Cardoso
Comentários
Enviar um comentário